
Toda corrida é diferente, tem sempre algo novo, o trajeto, o clima, ou até mesmo você. Isso, você também muda. Cada dia você é um, diferente das outras vezes, assim tudo pode variar, desde seu estado de espírito até o quanto de fato você se preparou.
Cada corrida traz uma nova lição e acredito que isso vale até mesmo para o mais experiente dos corredores. Pode até ser que você não se dê conta, mas sempre existe uma lição para se aprender em cada corrida que se faz.
Ontem na São Silvestre foi assim, pelo menos para mim.
Diz a sabedoria popular que só morre afogado quem sabe nadar, quem não sabe no máximo molha as canelas e pelo que me consta nunca ouvi falar de alguém que tenha empacotado nessas condições.
A experiência, via de regra, é algo que deve ser um ponto a favor, uma vantagem em tese...bom...em tese. Por outro lado, a experiência pode se disfarçar numa grande armalhida, basta que você deposite nela, uma pitadinha que seja da sua dedicação. Em outras palavras, confiar na sua experiência para abrir mão da devida dedicação certamente lhe trará um custo.
A minha quarta São Silvestre me trouxe essa lição.
Para mim essa foi a pior e a melhor de todas.
Se cada corrida é diferente da outra (mesmo que seja a mesma), na São Silvestre essa máxima é mais que verdadeira. Já corri São Silvestre na chuva, com sol de rachar, com mormaço, só não corri ainda com frio o que desconfio que nunca irá acontecer.
Ontem fiz o que considero o pior de meus tempos na mesma ordem de grandeza de quando fiz minha primeira São Silva, mas acabei bem estragado, diferente da primeira vez quando cheguei sobrando. Mas se o tempo foi o mesmo o que diabos então teve de diferente?
Tudo!
Desde o quanto de fato me preparei, até minha alimentação no período pré-prova. Na primeira vez, corri com medo de não conseguir completar a prova, me preparei como nunca até e desde então. Cheguei com sobra. Ontem ao contrário, havia me preparado o "suficiente", ledo engano, descoberto dolorosamente a cada passada, principalmente após o décimo quilômetro.
Se na primeira vez a falta de experiência funcionou no sentido de ter que buscar meu melhor, ontem a experiência acumulada fez com que me acomodasse, fazendo surgir uma "continha" a ser paga.
Se por esses aspectos essa foi minha pior São Silvestre, outros a fizeram a melhor delas.
De cara larguei tendo ao meu lado pelos primeiros quilomêtros a companhia do Raul, dono da loja especializada de artigos espotivos, Fast Runner. Por obrigação de ofício e por trajetória atlética sua experiência é notória fazendo de sua companhia um privilégio e tanto.
Era também a primeira São Silvestre da Regiane, minha cunhada, e do Daniel Bunduki (companheiro de trabalho e de corridas) e poder estar lá nesse dia tão importante para eles também foi muito legal.
Desencontramos do Dani, mas isso não impediu de mandar bom fluídos para ele, que segundo minhas informantes de arquibancada (minha mãe e minha sogra) completou a prova muito bem. Moço novo é uma beleza, aliás o Dani vai ser papai então meus parabéns para ele e para a Valquíria, a new mammy do pedaço.
A Regiane fez uma prova brilhante, um relógio, o mesmo ritmo do começo ao fim, chegando super bem, inteirona. Mais uma façanha do Jaspion, o que esse cara consegue...Ela deve ostentar sua medalha de concluinte da prova com o maior e mais justo orgulho do mundo. A cereja do bolo foi estar chegando próximo da linha de chegada e ouvi-la me chamando. Cruzamos a linha de chegada quase juntos, já que como bom cavalheiro e atleta dei a ela essa exclusividade mais que merecida. Aquele era uma momento dela, só dela. Poder testemunhar sua emoção me fez voltar no tempo e sei exatamente o que ela sentiu.
A companhia de minha esposa na prova também é um privilégio e tanto. Mesmo que seja somente até a largada, já que ela é um pé de vento, corre que só ela. Enquanto a maioria dos corredores tem que administrar o humor da companheira quando sai para correr, eu ao contrário tenho uma corredora como companheira e para variar como tantas coisas em nossa relação, sou eu quem faço as vezes da mulher e pego no pé dela. Nossa amiga é um viciada em medalhas, um "Mutley" preso no corpo de uma mulher, o que faz com que ela não perca uma única corrida, tem medalha ela está lá.
De tudo de bom que essa prova me deu, o melhor mesmo foi o quanto eu consegui me superar. Acredito que superei mais um de meus limites. Mesmo tendo já feito provas mais longas e desgastantes, nunca antes precisei tanto usar minha cabeça (para não arregar). Nunca o percurso havia exigido tanto de mim, ainda nem sei bem ao certo como consegui resistir a tentação de dar uma andadinha que fosse, mesmo no meu passinho de elefante, fui chegando...
Se faltou treino (e faltou e muito) acabei descobrindo uma nova fronteira de meu limite mental, que espero não ter que usar na próxima São Silvestre, com treino fica mais fácil e prazeroso.
Descobrir esse limite não me inocenta de minha falta como corredor, essa é a lição que tem que ficar.
P.S. Depois de um puxão de orelha de minha esposa e ainda que tardiamente mais um registro. Assim como nos anos anteriores fomos recebidos pela galera do Bicbanco, que aliás sempre esteve comigo desde o começo. Nesse agradecimento não posso deixar de citar aquele que tenho o privilégio de sua amizade: Eduardo Austregésilo, "mai bródi" Du. Quem tem bom coração tem como o dele não mais.